Administrador de empresas que há mais de 40 anos atua no setor da construção civil e materiais de construção, o presidente da União Nacional de Entidades do Comércio e Serviços (UNECS), José César da Costa, elenca, nesta entrevista ao Anuário ABAD, as muitas demandas do segmento que tramitam no Congresso Nacional. Acumulando o cargo de presidente da Confederação Nacional de Dirigentes Lojistas e membro da FIRA (sigla em inglês da Federação de Associações Internacionais de Varejo), José César fala, também, das dificuldades de aprovação de temas complexos, como a Reforma Tributária, em ano eleitoral e das perspectivas para 2022, ano marcado pela pressão inflacionária: “Temos força para crescer e domar essa inflação”. Leia, a seguir, a entrevista.
Anuário ABAD – Quais as pautas prioritárias da UNECS para 2022?
José César da Costa – São muitas, mas gostaria de destacar algumas. As reformas estruturantes, por exemplo, são temas prioritários para o nosso setor. Acredito que a Reforma Tributária e a Reforma Administrativa e ações que diminuam o tamanho do Estado sobre o setor produtivo são fundamentais para o desenvolvimento social e econômico no País, mas esses são temas mais complexos que levam maior tempo de maturação. Neste momento, estamos concentrando esforços em medidas que possam diminuir a burocracia e melhorar o ambiente de negócios, como é o caso do PLP 178/2021, uma iniciativa da nossa associada a Associação Brasileira de Tecnologia para o Comércio e Serviços (Afrac), que tem como autor na Câmara o deputado federal Efraim Filho (União-PB). Esse projeto institui o Estatuto Nacional de Simplificação de Obrigações Tributárias Acessórias, um incentivo à conformidade e à padronização de legislações e sistemas para o cumprimento de obrigações acessórias em âmbito Federal, Estadual e Municipal. A proposta é muito importante não apenas para o setor de comércio e serviços, uma vez que, com a aprovação, será possível diminuir o custo não só para as empresas, mas também para as pessoas físicas e, no fim das contas, para o consumidor final. Outro projeto é o PLP 108/2021; essa proposta permite o enquadramento como MEI [Micro Empreendedor Individual] de pessoa com receita bruta anual igual ou inferior a R$ 130 mil, além de permitir que o MEI contrate até dois empregados. O PL 1489/2019, de muito interesse para a ABAD, que trata da relação contratual de revenda e distribuição entre fornecedores e distribuidores de produtos industrializados, sem distinções. O PL 316/2021, que trata da prisão de gerentes em prol de reduzir a pena cominada aos crimes contra as relações de consumo, de 2 a 5 anos ou multa para 6 meses a 2 anos ou multa, com o objetivo de corrigir a dosimetria de suas penas. E lembro também o PL 1774/2019, que possibilita a ampliação do rol de estabelecimentos autorizados à venda de medicamentos isentos de prescrição, o que facilita a sua cadeia de distribuição, promove a concorrência, a queda de preços ao consumidor final e a economia de recursos públicos aplicados na área da saúde.
Anuário ABAD – A aprovação da reforma tributária, pela sua importância, é elencada como prioridade para diversos segmentos. O senhor considera factível sua aprovação em ano eleitoral?
José César da Costa – A Reforma Tributária é um assunto ao mesmo tempo urgente e complexo. Envolve todos os entes federativos e setores importantes da economia, e sabemos que é difícil ajustar um modelo em que todos saiam ganhando. Nós, do setor de comércio e serviços, não temos a ingenuidade de pensar que uma reforma dessa magnitude possa ser resolvida de forma integral ainda este ano. Ao mesmo tempo, entendemos ser de suma importância encontrar algum mecanismo que traga alívio para nosso setor, principalmente depois de termos passado pela pandemia. Quem sabe a aprovação do PLP 178, que já foi apelidado de “Minirreforma Tributária”, não possa ser alternativa mais imediata? Seria uma boa saída e uma alternativa à PEC 110, que está tramitando no Senado e que ainda não está totalmente de acordo com os anseios do nosso segmento. Discutimos essa matéria com diversos especialistas e ainda não estamos certos de que ela seja a solução para quem mais paga imposto e emprega no Brasil. Acho que os debates em torno da PEC 110 precisam de maior maturação.
José César da Costa é empresário do ramo de construção civil e materiais de construção há 40 anos com formação em Administração de Empresas. Foi presidente da FCDL-MG no período de 2007 a 2013. Atuou ainda como vice-presidente do Conselho Deliberativo do SPC Brasil. Atualmente é presidente da CNDL, cargo que assumiu em 2017, e da UNECS (União Nacional de Entidades do Comércio e Serviços), desde março de 2021; é membro da FIRA, sigla em inglês da Federação de Associações Internacionais de Varejo
Anuário ABAD – O ano eleitoral, aliás, tende a esvaziar o Congresso Nacional e dificultar a votação de projetos. Essa realidade preocupa a UNECS?
da Costa – Em outubro acontecem as eleições nas quais serão disputadas vagas para deputado federal, deputado estadual, senador, governadores e presidente da República. É sabido que em ano eleitoral todos os esforços políticos se voltam para as campanhas e que temas mais sensíveis ficam reservados para a próxima legislatura. Esse é o momento, portanto, de lembrar aos nossos interlocutores, lideranças lojistas, representantes no Congresso Nacional e parceiros institucionais que não há tempo a perder. A agenda do setor de comércio e serviços ainda é extensa e carece de ajustes importantes para garantir um ambiente de negócios mais pujante, moderno e próspero para o País. São muitos os desafios. E, claro, há aqueles que podem achar otimismo exagerado em quem busca aprovação de projetos dessa relevância em um ano de embates eleitorais. Nós entendemos que esse cenário também pode ser uma oportunidade, uma vez que os parlamentares também querem dar uma resposta ao seu eleitor e apoiadores e isso inclui o setor de comércio e serviços. É de olho nesse cenário que vamos à luta. Se depender de nós, 2022 vai ser lembrado para muito além das urnas.
Anuário ABAD – O Brasil começa a viver uma nova realidade – a da pós-pandemia. Como esse “novo normal” impacta os segmentos do comércio e serviços?
da Costa – Acho que a mudança mais significativa no setor do comércio e serviços foi, sem dúvida, nos hábitos de compra do consumidor, que se digitalizou. Já vínhamos apontando essa tendência há anos, mas a pandemia catalisou essa transformação que obrigou o varejista a atuar nas mais diversas plataformas sem, contudo, renunciar à integração desses modelos com a loja física. Isso, claro, sem perder de vista a experiência da compra, do atendimento e da eficiência. Em outra dimensão, a pandemia também abriu debate sobre o propósito das empresas. Discutimos esse assunto na última Convenção Nacional do Comércio Lojista, promovida pela CNDL [Confederação Nacional de Dirigentes Lojistas] em maio, na cidade de Campos do Jordão [Interior de São Paulo]. Ali ficou claro para todos que as empresas e marcas serão cobradas por sua responsabilidade social, ambiental e ética. Isso tem a ver com a cultura do varejo, que, mais cedo ou mais tarde, terá que se adaptar a um mundo que pede maior inclusão, diversidade e compromisso com valores caros à sociedade como um todo.
Anuário ABAD – Recentemente, a diretoria da UNECS se reuniu com o ministro Paulo Guedes para apresentar as demandas dos setores que representa. Qual a sua avaliação do encontro? Há perspectivas de que algumas das reivindicações sejam implementadas?
da Costa – Tivemos um encontro excelente com o ministro Paulo Guedes. Ele recebeu nossas demandas e levou uma mensagem de otimismo a toda a UNECS. Afirmou que o Brasil vai entrar em um ciclo de recuperação econômica e que o País tem margem para estimular a economia, em especial no que diz respeito ao estímulo dos microempreendedores individuais, os MEIs. Naquele encontro, o ministro anunciou um programa de expansão do crédito aos MEIs e injeção de dinheiro novo na economia. O que vimos nos meses seguintes foi exatamente isso. O governo lançou o programa Renda Oportunidade, que entre outras ações lançou uma política de microcrédito para MEIs e os trabalhadores informais, autorizou o trabalhador a sacar recursos do FGTS e antecipou o saque do 13º de aposentados e pensionistas. À época do encontro, Paulo Guedes ouviu nossos pedidos de apoio à derrubada do veto presidencial ao Relp [Programa de Reescalonamento do Pagamento de Débitos] das microempresas. O ministro disse ter certeza de que o Congresso derrubaria o veto e foi o que aconteceu. Outro projeto pelo qual batalhamos muito no ano passado e que também recebeu apoio do ministro Paulo Guedes foi o PL 2058/2021, que possibilitou o retorno presencial ao trabalho da empregada gestante e imunizada durante a pandemia. Quando ouviu nossas argumentações sobre a importância da proposta, ele achou razoável a sua aprovação e a matéria foi aprovada sem problemas. Então, o encontro da UNECS com o ministro foi a demonstração da eficiência da nossa representação e, ao mesmo tempo, da sensibilidade de Paulo Guedes em relação às dores do setor de comércio e serviços.
Anuário ABAD – Hoje, a UNECS representa 73% do PIB nacional, o que coloca a entidade como um interlocutor importante junto ao Executivo e ao Legislativo. Essa relevância tem possibilitado a obtenção de avanços que contribuam para a melhoria das relações comerciais e o desenvolvimento econômico do País?
da Costa – Sinto-me honrado em assumir a missão de liderar uma entidade dessa magnitude e de tamanha importância para o Brasil. Todo brasileiro deseja um País mais moderno, produtivo e próspero, e a UNECS tem papel fundamental nesse processo de transformação nacional. Como falamos na pergunta anterior, nossas entidades têm demonstrado competência nos grandes debates nacionais e na formulação das políticas públicas. Acho que isso tem a ver com a qualidade das nossas lideranças e com a relevância que o nosso setor apresenta na economia brasileira. Além disso, a UNECS tem contado com o apoio da Frente Parlamentar Mista em Defesa do Setor de Comércio e Serviços (FCS), conduzida com maestria pelo seu presidente, deputado federal Efraim Filho (União-PB), que consegue fazer um belo trabalho de mobilização no Congresso Nacional. É dessa forma que seguimos defendendo com afinco projetos que garantam a melhoria do ambiente de negócios; que possibilitem a simplificação do sistema tributário e a modernização das leis trabalhistas. Entendemos que essa é a melhor maneira de o Brasil voltar a ter um crescimento digno da sua dimensão continental e, assim, cumprir o seu destino de País desenvolvido, justo e livre.
Anuário ABAD – Hoje, o Brasil vive mais uma crise econômica, com a inflação superando todas as expectativas. Quais as suas previsões para 2022?
da Costa – Difícil fazer previsão, mas acredito que temos que ter em mente que essa inflação é reflexo de uma condição atípica. Tivemos o problema da pandemia por quase dois anos, o que provocou a alta de alimentos e energia no mundo inteiro. E ainda veio uma guerra no coração da Europa. Esse quadro inflacionário está sendo enfrentado por todos os países. Também tivemos alguns ruídos no campo político, que podem ter gerado alguma incerteza. De qualquer forma, sou um otimista e vejo o lado bom da história. Acho que depois das eleições tudo vai se assentar. O Brasil conseguiu avançar na vacinação da população, e com isso voltamos às nossas atividades. Hoje, vemos sinais de que o setor de comércio e serviços opera em níveis acima dos anteriores à recessão de 2015, o que é um excelente indicativo de que temos força para crescer e domar essa inflação.