Pandemia derruba projeções e muda hábitos de consumo

Um retrato desse “novo normal” foi produzido pela consultoria Kantar Brasil. O Consumer Insights 2020 acompanhou as mudanças no comportamento de compra dos brasileiros ocorridas a partir da instalação da pandemia.

A chegada ao Brasil da pandemia provocada pelo novo coronavírus provocou impactos inimagináveis na economia do País, derrubando as projeções até então otimistas para este ano e provocando forte retração nos indicadores. Segundo o IBGE, a taxa de desemprego subiu, elevando para 12,9 milhões o total de pessoas sem trabalho. Em março, o PIB fechou com retração de 0,48%, com indicação de queda ainda maior, segundo levantamento do Relatório Focus, divulgado pelo Banco Central. O índice de confiança do consumidor medido pela Fundação Getúlio Vargas caiu 7,6 pontos em março, atingindo 80,2 pontos, o menor desde janeiro de 2017. Diante desse cenário, o consumidor brasileiro precisou se reinventar, mudando hábitos de compra e optando por novos canais.

Um retrato desse “novo normal” foi produzido pela consultoria Kantar Brasil. O Consumer Insights 2020 acompanhou as mudanças no comportamento de compra dos brasileiros ocorridas a partir da instalação da pandemia, com análise de 107 categorias das cestas de produtos de alto giro. O estudo revela que, em março, houve um pico de compras, especialmente de produtos de limpeza e alimentos já com vistas ao período de isolamento social. Para realizar suas compras, o consumidor mixou canais, dando preferência àqueles com menor acúmulo de pessoas e perto de sua residência. Assim, o pequeno varejo de autosserviço teve acréscimo de 3,5% de penetração, o que representa mais de 2 milhões de lares comprando nesse canal.

Quando se olha para a missão de compra, a chegada da pandemia trouxe uma nova dinâmica. O critério de proximidade ganhou relevância, destacando-se a preferência dos consumidores pelo pequeno varejo e varejo tradicional. Para as compras de reposição o critério de proximidade também pesou na escolha. De acordo com o estudo Consumer Insights 2020, o pequeno varejo conquistou 1,8 milhão de compradores; o varejo tradicional atraiu 1,5 milhão de consumidores. Para as compras de abastecimento, embora o cash & carry tenha atraído 1,4 milhão de novos compradores, o pequeno varejo se destacou, atraindo 1,2 milhão de novos consumidores, que preferiram fazer suas compras em canais menores, evitando aglomerações.

Indulgência

Com praticamente todo o Brasil vivendo em isolamento, o consumo fora do lar despencou. De outro lado, o consumo dentro de casa, além de crescer, revelou que a tensão e preocupação dos brasileiros deu um incremento nas compras das categorias ligadas à indulgência. Leite condensado, creme de leite e cerveja foram as categorias que mais cresceram quando comparada a semana iniciada em 4 de maio com a iniciada em 9 de março. Proporcionar prazer foi a razão de consumo que mais cresceu na escolha do consumidor para os momentos de almoço e jantar. E o vinho ganhou novas ocasiões de consumo também nos dias úteis, com crescimento de 19%; aos finais de semana, o crescimento foi de 6%. A opção de ter o vinho como acompanhamento das refeições cresceu 88%.

Um dado interessante apontado pela pesquisa mostra que, apesar de estar em casa, o consumidor não ficou parado, tendo que lidar com várias demandas, como o trabalho profissional, os cuidados da casa, dos filhos. Assim, o tempo precisou ser bem distribuído. Menus mais simples, que levam até 20 minutos para o seu preparo, cresceram 5,5%. Nesse contexto, a primeira opção em todo o Brasil foi o sanduiche. Por região, as escolhas são bem específicas. No Nordeste houve crescimento no consumo de cuscuz e tapioca; no Rio de Janeiro, massas; em São Paulo, macarrão e arroz e, no Sul, carne moída. O delivery, que ganhou força durante a quarentena e satisfez a indulgência, com crescimento pedidos de fast food e pizzas, foi definitivamente incorporado ao dia a dia dos brasileiros. Segundo o Consumer Insights 2020, 19% dos entrevistados afirmaram que, mesmo após o fim do isolamento, continuarão a pedir comida pronta.

E o amanhã?

Responder como os brasileiros sairão dessa experiência inusitada é tarefa difícil. O estudo da Kantar aponta questionamentos que deverão ser enfrentados por varejistas e a indústria para atender a um novo consumidor. No Brasil pós-isolamento, o varejo precisará saber que tipo de promoção e em que volume pode gerar mais retorno, qual o desconto a ser realizado, como melhor aproveitar as missões de compra em cada canal, qual o sortimento otimizado por canal. Já a indústria, no curto prazo, precisará identificar se a sua marca está preparada para atender às necessidades latentes dos consumidores diante de uma realidade de bolso comprometido, menos ocasiões de compra, novas rotinas. A médio prazo, deverá enfrentar o desafio de construir confiança em um ambiente de instabilidade, criando estratégias otimizadas de comunicação, valorizando a transparência e o crescimento humanizado. E, no longo prazo, será necessária a redefinição de inovações e planos, repensando sortimento e papéis dos canais, e implementação de inovações que atendam às novas necessidades de um consumidor muito mais atento à relação custo x benefício.

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