Com áreas entre 4 mil e 6 mil metros quadrados e custos 15% menores, em média, os atacarejos se multiplicaram no País, com desempenho positivo. No entanto, para oferecer cada vez mais serviços aos consumidores, as redes de cash and carry estão se tornando mais parecidas com supermercados, havendo o risco de descaracterização do modelo.
No Estado de São Paulo, os cash and carry representam cerca de 30% de toda a venda do varejo alimentar, que foi da ordem de R$ 307 bilhões no ano passado. Este levantamento é da Varejo 360, empresa que utiliza inteligência artificial para fazer pesquisa de mercado a partir de tíquetes de compras fornecidos por consumidores. Somente no Estado de São Paulo, portanto, os atacarejos venderam cerca de R$ 76 bilhões no ano passado, número que deve crescer dois dígitos neste ano, mantido o resultado até abril. No primeiro quadrimestre deste ano, o faturamento do setor cresceu 10% em relação a igual período do ano passado, considerando as mesmas lojas, e 23,4% somando as novas.
Em abril do ano passado, eram 478 lojas no Estado de São Paulo, número que subiu para 522 em abril deste ano, ou 44 unidades a mais, de acordo com a Varejo 360. A rede Assaí foi a que abriu mais loja no período (23), seguida pelas redes Atacadão (11), Tenda (4), Roldão (2), Tonin (2), Esperança (1), Mercadão (1), Giga (1), Bem Barato (1) e outras.
Em algumas cidades paulistas, os atacarejos chegam a representar até 62% de toda a venda do varejo alimentar, como é o caso de Jandira, com lojas do Assaí, Atacadão e Roldão. Municípios em que a participação supera 50% são: Praia Grande (60%), Itanhaém (57%), Ribeirão Pires (56%), Guaratinguetá (54%), Taboão da Serra (53%) e Cotia (52%).
Esses números estimulam a expansão e os negócios no setor. Em janeiro deste ano, o grupo paranaense Muffato adquiriu 16 lojas da rede atacadista Makro. Com a aquisição, a empresa se prepara para disputar o mercado de atacarejo em São Paulo e interior, com a bandeira Max Atacadista. O grupo catarinense Pereira, com forte atuação na região Centro-Oeste do País, entrou no Estado de São Paulo ao abrir a sua primeira loja, a Fort Atacadista, em Jundiaí. O grupo Savegnago adquiriu do grupo Peralta 14 lojas da bandeira Paulistão, localizada no interior paulista, das quais duas unidades serão transformadas em atacarejo.
Fora do Estado, o mercado de cash and carry também está em expansão. A rede Zaffari, do Rio Grande do Sul, acaba de inaugurar a sua primeira loja em Gravataí com a bandeira Cestto. A rede catarinense Angeloni também anunciou, no início deste ano, a sua entrada no mercado de atacarejo com a bandeira Super A Atacadista, em Blumenau (SC).
Apesar de até agora os cash and carry terem se revelado um bom negócio tanto para quem vende como para quem compra, surgem dúvidas se este modelo de loja se sustenta. Na corrida para oferecer cada vez mais serviços para os consumidores, o fato é que os atacarejos estão cada vez mais parecidos com os supermercados. “Se oferecem mais serviços, os cash and carry correm o risco de ficar com os mesmos custos e, consequentemente, com os mesmos preços dos supermercados”, afirma Fernando Faro, fundador e COO da Varejo 360. “E, se os preços são parecidos, o consumidor vai pensar duas vezes antes de se deslocar para uma loja mais longe de casa”, diz Marcos Escudeiro, professor e conselheiro de empresas.
“Há 20 anos, todo o supermercadista queria ser um atacarejista. Hoje, todo o atacarejista quer ser um supermercadista”, afirma Ricardo Roldão, presidente do conselho do Roldão. Com 40 lojas e um faturamento da ordem de R$ 4,5 bilhões, a rede se prepara para abrir mais quatro unidades neste ano. “Os pontos dessas lojas são bem distantes da concorrência. Só vamos expandir daqui para a frente nas chamadas áreas brancas”, afirma.
O modelo de loja cash and carry, de acordo com Roldão, vem mudando muito rapidamente em razão da corrida das redes para agradar cada vez mais os consumidores. Há uns 20 anos, diz, a participação dos pequenos comerciantes representava cerca de 65% do faturamento das lojas e, dos consumidores, 35%. Hoje é exatamente o contrário. “Não há dúvida que está tendo um desequilíbrio no ecossistema de canais, o que é perigoso, pois pode resultar em aumento de custo e desconfiguração do modelo”, afirma.
Márcio Milan, vice-presidente da Abras (Associação Brasileira de Supermercados), diz que existe um movimento dos atacarejos para agregar serviços por exigência dos consumidores. “Com a inflação mais alta, o cliente passou a fazer compra em mais canais e, para atender essa mudança de comportamento, alguns atacarejos aumentaram o mix de produtos.” Outros, diz, não só ampliaram a oferta como passaram a oferecer serviços. “O risco da loja é perder a sua característica, que é ter linhas adequadas ao tipo de negócio e preços menores.”
Com o cenário econômico atual, de acordo com Faro, não dá para esperar uma grande expansão do mercado de atacarejo como se tem visto até agora. “Não consigo ver a entrada de novos consumidores. O que dá para prever é uma rede tirando cada vez mais cliente da outra ou dela mesma, caso tenha uma loja próxima da outra”, diz. “No Estado de São Paulo, já acendeu a luz amarela no setor de atacarejo. Os grandes players não vão conseguir crescer com as mesmas taxas do passado porque a base é alta”, acrescenta.